Sustentabilidade em liquidação

Por Bruno Rezende.

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O conceito distorcido de Sustentabilidade chegou ao departamento de marketing das empresas e já começa a ser utilizado em larga escala como um diferencial competitivo. Você já não agüenta mais ouvir falar que tal banco é o mais sustentável do mundo, que tal evento de música é sustentável, que as ecobags são a solução para o mundo? Calma, as coisas ainda vão piorar, pois qualquer um pode dizer que é sustentável e ninguém vai questionar. Sabe por quê? Desinformação. Poucos sabem a real definição de sustentabilidade e quanto menos pessoas souberem melhor para os bolsos.

coluna zero, meio ambiente, sustentabilidade, consumo consciente, utopia, economia, liquidaçãoPara começar, uma pesquisa do Instituto Akatu, publicada aqui no final do ano passado, revelou que apenas 16% dos entrevistados sabem definir o que é sustentabilidade – e eu achava que era menos. Além disso, muitos brasileiros dão a definição incompleta do termo, acham que sustentabilidade tem a ver apenas com preservação do meio ambiente. Ta legal, mas não é só isso. Existem várias definições de sustentabilidade, a maioria é bem curta e baseada no tripé: economia, sociedade e meio ambiente. Há algum tempo atrás eu publiquei em outro post uma definição mais completa, que segue abaixo:

    “Ser sustentável é ter a capacidade de criar, produzir e consumir levando em consideração os aspectos econômicos, sociais e ambientais presentes. É usar com responsabilidade os recursos disponíveis sem riscos de esgotá-los, respeitar os valores sociais e culturais e ter justiça na distribuição de benefícios e lucros, garantindo que as gerações futuras possam usufruir deste sistema para suprir suas necessidades”.

Trata-se de um conceito bem amplo que envolve outras preocupações além da ambiental. Na minha visão o conceito de sustentabilidade se torna um termo utópico diante de uma sociedade com valores socioculturais baseados no consumismo, um comportamento que só interessa a essas mesmas empresas que se dizem sustentáveis.

Pergunto: Um banco que se diz sustentável é justo na distribuição de benefícios e lucros? Vai pedir um empréstimo ou deva uma parcela do seu cartão de crédito para ver o que acontece.
Um evento de música em São Paulo, que se diz sustentável, respeita a cultura local ao chamar diversas bandas estrangeiras? Sem contar os preços absurdos de ingressos, serviços, alimentação e a absurda proibição de levar qualquer alimento de casa. ISSO É SUSTENTABILIDADE?

O engraçado é que tanto o Banco mais Sustentável do Mundo quanto o Evento Sustentável possuem nomes que terminam com “u”, de UTOPIA.

Como eu disse no início do post, poucos sabem a definição real de sustentabilidade, pois se toda a sociedade soubesse teríamos instalado no país um grave problema econômico. Logicamente que os setores públicos e privados não deixarão isso acontecer, por isso é preciso manter a desinformação e continuar associando a sustentabilidade apenas às questões ambientais.

E por falar em problemas econômicos, a nossa economia é uma grande vilã na aplicação do conceito de sustentabilidade. Entre tantas coisas importantes destacadas por Hugo Penteado na palestra sobre economia ecológica, ele diz: - uma árvore só tem valor econômico quando está no chão.

É simples, não tem como aplicar o conceito de sustentabilidade através da antiquada lógica econômica desenvolvimentista que permanece até hoje. Chega para o Banco sustentável de hoje e fala que ao invés de provocarmos mais atividade econômica o ideal é distribuir melhor a riqueza e reprogramar as bases da economia global. Provavelmente vão rir de você e te por pra correr. Só que este tipo de ação que faz parte do real conceito sustentável, pois enxerga o planeta e todas suas bases na totalidade. Não adianta preservar uma árvore derrubando 10 para suprir os anseios da sociedade consumista, a mesma que precisa de crédito do banco para poder suprir seu vazio emocional comprando.

Recentemente eu li um artigo do professor Leonardo Boff intitulado “Sustentabilidade: adjetivo ou substantivo”. O texto é excelente e indispensável, leia! Destaco aqui o seguinte trecho desse texto:

    Não nos iludamos: as empresas, em sua grande maioria, só assumem a responsabilidade socio-ambiental na medida em que os ganhos não sejam prejudicados e a competição não seja ameaçada. Portanto, nada de mudanças de rumo, de relação diferente para com a natureza, nada de valores éticos e espirituais. Como disse muito bem o ecólogo social uruguaio E. Gudynas: “a tarefa não é pensar em desenvolvimento alternativo mas em alternativas de desenvolvimento”.

Para finalizar, já que falei tanto do “banco mais sustentável do mundo” vou questionar outra coisa. Quem escolheu este banco como exemplo de sustentabilidade foi um jornal britânico especializado em negócios e finanças. Ele criou um concurso de sustentabilidade para bancos, uau! Que moral um jornal de finanças tem pra falar de sustentabilidade? Um surto de demência!

Então qualquer um pode escolher quem é ou não sustentável? Se é assim: estão abertas as incrições para o Prêmio Coluna Zero de Insustentabilidade. Que tal?

Já ia me esquecendo: não se engane com qualquer produto dito “verde”. Enquanto a sustentabilidade não for tratada com uma visão global e séria, muitos desses produtos se apresentarão como meros engodos. Nesse meio têm muitos produtores mal intencionados que estão se aproveitando dessa onda verde para vender muito e, logicamente, lucrar, assim como as grandes corporações que muitos deles criticam. O resultado disso é o Eco-consumismo, formando uma sociedade de consumidores Verdes Otários que por exemplo, acreditam na falsa ideia da Ecobag como solução. A gente não quer isso.

Cada post que escrevo aqui me dá a sensação que estou me prevenindo de um câncer. Até o final de 2010 minhas maiores críticas eram apenas em relação ao consumo consciente, mas agora as coisas estão piorando muito, o que está fazendo este blog tomar outro rumo. Se não bastasse a mídia tradicional, vejo blogs que falam sobre sustentabilidade repassando informações distorcidas e tendenciosas com fins exclusivamente econômicos, sejam através de produtos verdes ou com atitudes vazias de empresas. Isso me assusta. Mas enquanto houver liberdade de expressão nesse país eu vou questionando. Desculpas aí a esses blogueiros mas preciso falar, ou melhor, já falei.




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